EXTORSÃO OFICIAL
Paulo Afonso
Linhares
Advogado, professor da Uern e diretor-presidente da Rádio Difusora de Mossoró
Para o filósofo
Voltaire, "o último degrau da perversidade é fazer com que as leis sirvam à
injustiça". Infelizmente, o cotidiano da sociedade brasileira tem mostrado
uma tendência casa vez mais presente de se impor obrigações fiscais e sanções
descabidas ao cidadão contribuinte. Na esfera estatal, as casas legislativas -
seja o Congresso Nacional ou simples Câmaras Municipais - têm sido pródigas em
instituir novos tributos ou simplesmente majorar suas alíquotas, mecanismos
eficazes para drenar cada vez mais recursos financeiros para os cofres públicos,
impondo-se excessivas obrigações às pessoas e instituições privadas, quebrando
por completo a noção de Justiça Tributária, sem qualquer pejo substituída por
formas de extorsão oficial. A lei é usada como elemento para
"tosquiar" financeiramente o cidadão, num distanciamento abissal
entre o legal e o que razoavelmente possa ser considerado como legítimo. Enfim,
uma perversidade contra o cidadão acobertada pela soberania (interna) estatal,
no exercício do "jus imperium".
Ora, um exemplo
dessa tendência malsã e contrária ao cidadão foi mais uma correção da tabela do
Imposto de Renda abaixo da inflação, ocorrida recentemente. Com efeito, para o
exercício de 2014, de acordo com os burocratas de Brasília a correção
dessa tabela ficará em 4,5%, que é o centro da meta da inflação estabelecida pelo governo federal, segundo o
Índice de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA),
embora as projeções de analistas de instituições financeiras para a inflação medida também pelo IPCA
seja de 5,75%. O absurdo dessa história é
que a tabela do IR já vinha sendo
corrigida pelo
percentual fixo de 4,5% desde 2007, porém, com previsão
para acabar com a utilização desse índice em 2010. Entretanto,
no início de 2011, através da Medida Provisória 528, o governo resolveu estender a aplicação desse percentual até 2014.
Aliás, essa defasagem entre a tabela do Imposto de Renda e a inflação pode chegar a
62% até
o final de ano, consoante estimativas do próprio
Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita
Federal do Brasil.
A consequência
dessa correção da tabela abaixo da inflação foi a incorporação de milhares de
trabalhadores ao rol dos contribuintes do Imposto de Renda, embora desprovidos
por completo daquilo que a Constituição, no parágrafo primeiro do seu art. 145,
denomina como "capacidade contributiva" ("Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão
graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses
objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da
lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte").
Para se ter uma ideia da gravidade disso, basta ver que, em 1996, quem ganhava
até nove salários mínimos era isento de pagar Imposto de Renda. Por outro lado, neste ano de 2014, quem ganha
acima de 2,5 salários mínimos (um pouco acima de R$ 1.700,00) vai pagar esse
tributo, o que não deixa de ser uma enorme injustiça contra os trabalhadores
brasileiros - sobretudo aquelas pessoas que
efetivamente não
têm condições econômicas de contribuir para o Imposto de Renda
- o que, infelizmente, não sensibiliza nem um pouco os políticos e burocratas
de Brasília.
Ainda para ficar no
universo tributário, basta ver a enorme gritaria dos contribuintes com a autêntica
extorsão que se faz, nas grandes cidades brasileiras, com a cobrança do Imposto
Predial e Territorial Urbano (IPTU), além
da taxa do lixo agregada e da absurda taxa de esgoto, esta cobrada na conta da água.
Outro absurdo é o caso das lombadas eletrônicas das vias públicas: a baixa
velocidade exigida facilita o descumprimento por parte dos condutores de veículos,
surpreendidos por esses aparatos que não passam de reles caça-níqueis. Se ao
menos parte dos recursos arrecadados com as multas servisse para financiar a
educação no trânsito, justificaria a cobrança, todavia, o trágico é que o
enorme volume de recursos arrecadados com as lombadas eletrônicas serve para
agravar o quadro já de há muito epidêmico da corrupção. Mais uma vez o furor
burocrático de extrair do cidadão todo o dinheiro possível, nem que para isto
tenha de pisotear a ética e o bom senso. Triste trópico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário