domingo, 5 de abril de 2015

Artigo

O país das consequências


Por François Silvestre
O Brasil nasceu sob o signo da pilantragem. E a tem cultivado com tanto esmero que deixa na rabeira a promíscua e hipócrita corte portuguesa.
O primeiro registro da promiscuidade está na carta inaugural da nossa literatura, quando Pero Vaz de Caminha dá a boa nova da descoberta, fala da nudez indígena, da paisagem exuberante, da fertilidade da terra, “onde se plantando, tudo dá”, e encerra pedindo um favor real para um parente.
Lembro de uma professora do primário, no “Almino Afonso” de Martins, que acentuava esse final da “Carta”, com a observação elogiosa: “Grande homem, mesmo distante e numa aventura perigosa, não esqueceu da família”. E todos nós concordávamos. Isto é, éramos pilantras desde a meninice.
Certo político nordestino, ao se eleger governador do seu Estado, reuniu a família e comunicou: “O hábito aqui é a família destruir o governo. Comigo será diferente, não haverá favorecimentos familiares”. Então, um parente pediu a palavra e comentou: “Quer dizer que você vai mudar o hábito e fazer o governo destruir a família”?
A mudança de hábito ficou só na promessa. E a família do “inovador” tomou conta de dois Estados.
Quando alguém, com conhecimento de causa ou insatisfeito por exclusão na partilha do butim, denuncia aos órgãos de investigação, uma suspeita de corrupção, o que se faz?
Arma-se uma tocaia de comprovação. Comprovada a denúncia, espera-se a consumação dos atos, para depois noticiar com alarde e holofotes a corrupção comprovada. Porém, a grana roubada já sumiu e não terá retorno.
Não seria mais eficaz a pronta intervenção preventiva, correção de rumos, evitando a evasão do dinheiro público? Até por que a correção não exclui a punibilidade de quem tentara o ato. A grana pública seria poupada, mas faltariam fanfarra e holofotes.
Agora mesmo, toma conta do país, duas propostas de apoio coletivo incontestável. A definição de família e a maioridade criminal. Uma pérola do moralismo e outra da hipocrisia.
A definição restritiva de família, que tramita no Parlamento, exige que o núcleo da moradia contenha um homem e uma mulher, necessariamente.
Todo ser humano nasceu de um homem e uma mulher. Portanto, todo agrupamento daí decorrente constitui-se família. É a definição da natureza. O resto é patifaria de moralistas. E o moralista se esconde na condição que combate.
A redução de idade para a maioridade penal é cabível, pois não há inocência aos dezesseis anos. Pergunto: aumentar o número dos imputáveis, no sistema atual, diminuirá a violência?
A mágica do coelho manco saído da cartola rota. No “se plantando tudo dá” cuidamos da colheita que é consequência, sem cuidar da plantação, que é a causa.
Té mais.
François Silvestre é escritor

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